sábado, 15 de outubro de 2022

A Vingança do Splish-Splash



Há trocentos anos atrás, quando eu ainda era adolescente, lembro de ter tido um debate amigável com minha querida mãezinha sobre a nossa amada música popular brasileira e suas nuances.
Estava eu ouvindo Legião Urbana ou alguma coisa de igual sucesso na época quando, ela gentilmente comentou:
-Mas que porcaria barulhenta é essa que você está escutando?
Indignado e revoltado, como só um adolescente sabe ser, imediatamente defendi não só a canção, como todo o pop rock nacional!
Nisso, o debate foi se acalorando e, já sem paciência, disparei:
- E esses bagulhos que a senhora houve? Esse tal de Roberto Carlos...
- O que tem de errado com as musicas do Rei?
- O cara é o Rei da musica brasileira e canta um troço chamado Splish-Splash – e, só de pirraça, comecei a cantar apertando o nariz e deixando a voz bem fanha.
- Splish-Splash...
Me recordo que minha mãe ficou bem chateada com aquela critica ao ídolo de multidões mas, eu fiquei satisfeito por ter ganho a discussão usando o único argumento que tinha a disposição.
Os anos se passaram e, como todo bom velho ranzinza, me tornei um feroz critico de toda e qualquer musica que tenha sido lançada de 1990 para cá.
Obviamente, e não tinha como ser de outra forma, fui confrontado por um adolescente que partiu, indignado e revoltado, para defender toda a sua geração de músicos e afins.
Como não podia debater sobre as letras pois, confesso que não sei nenhuma por total e pura falta de interesse, resolvi apelar para outro caminho.
- No meu tempo – comecei, igual todo velho ranzinza começa – até os nomes  das bandas eram mais legais e criativos! Por exemplo, tínhamos a Legião Urbana, um nome forte e significativo. Um fã da banda se dizia um Legionário.
- E dai? – perguntou-me o jovem petulante, com cara de tédio.
- Como “e dai?” Era uma forma de identificação com a banda e sua ideologia! Ser um Legionário era compartilhar da filosofia e ideologia de Renato Russo – falei, tão emocionado que ate lágrimas me vieram aos olhos.
O adolescente, que como todo adolescente sabia ser irritante, bocejou, tirou o celular do bolso e começou a digitar.
- Não vejo em que isso é importante...
Cada vez mais irritado, citei outros nomes marcantes de bandas dos anos 80 e acabei indo parar no Raulseixismo e suas implicações politicas e filosóficas.
- Agora me responda – arrematei triunfante – como se chama um fã de Harmonia do Samba? Harmônico? E do DJ Kevinho? Degustador ou alcoólatra? E um fã de Annita? Seria um Anittaixista? 
E encerrei como meu avô sempre encerrava suas falas:
- Me faça uma garapa!
O adolescente, sem tirar os olhos do celular, então me perguntou:
- E o Biquini Cavadão?
- O que tem eles? – perguntei surpreso.
- Estou vendo aqui na internet que tinha uma banda com esse nome...
- Sim, tinha. E dai?
- Um fã de Biquini Cavadão, o que é? Um vendedor de moda praia ou um tarado?
E foi assim, com um único argumento, que o Vento e a Ventania levaram para longe qualquer chance que eu tinha de vencer aquela discussão.
Com a desculpa de ter lembrado de um compromisso urgente, saí de fininho enquanto o irritante adolescente, mal disfarçava um sorriso triunfante de canto de boca.
Foi nesta hora que eu lembrei de minha mãezinha e seu Splish-Splash, e imaginei Roberto Carlos, sentado em seu trono, sorrindo igual ao adolescente, e cantando:
- Splish-Splash...

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