quarta-feira, 12 de outubro de 2022

As Correspondências Parte Dois - Resposta de Jesuíno a Terêncio


“Caro vizinho,
Venho através desta responder a altura o monte de sandices que o senhor me escreveu:
Somos vizinhos a quinze anos e não nos falamos desde que você implicou com meu abacateiro. 
Não tenho culpa se seu filho, que é magro parecendo um graveto, se assustou quando percebeu que eu o vi roubando abacates, e caiu da árvore. Se você tivesse ensinado que pegar as coisas dos outros é feio, ele nem roubaria os abacates e nem cairia da árvore. 
Se o senhor me explicar como seu quintal está cheio de folhas de mangueira e elas vieram do meu abacateiro, te agradeço. 
E, como eu disse, pé de manga só tem no terreno de Tobias.
Aliás, já que falamos de filhos que incomodam os vizinhos, fale com o seu que pare de buzinar quando chega com aquela bicicleta enferrujada e faça uma porcaria de uma chave do cadeado do portão porque ninguém é obrigado a ficar ouvindo esse troço às onze horas da noite. 
Se ele gosta de buzinar, que vá fazer cover do Chacrinha em outro lugar. 
Quanto ao meu cunhado, concordo com você que está todo errado em ficar com Patrícia Perna Torta. Mas, como ela é sobrinha sua, melhor no seu muro que no meu afinal, meu cunhado não é meu parente. 
Vou prender meu cachorro para que ele nem passe perto de sua casa mas, ele além de não ter pulgas, é bem comportado. 
Fiquei aqui pensando que, se entre todas as casas da rua, ele escolheu a sua para fazer suas necessidades, deve ser porque a frente está tão suja que ele pensou ser um banheiro público. 
Perdoe um animal pela imundície do outro. 
Minha esposa só repetiu o que todo mundo sabe sobre seu filho e a esposa. Inclusive gostaria que você agradecesse a ele por livrar o meu dessa sina. Chifre aqui em casa só se eu criasse gado. 
Perguntei a minha filha se ela precisava de óculos ou de consulta com o psiquiatra, para estar atrás de seu filho. 
Mas, após as explicações, dei até razão a ela: quando se empresta dinheiro a caloteiro, tem que ficar atrás mesmo senão nunca recebe. 
Quanto ao meu abacateiro, duvido que você o queime porque, pelo cheiro diário de ovo frito na hora do almoço que vem de sua casa, não creio que você tenha como comprar gasolina. 
Aliás, se o abacateiro soltar folhas de manga, estamos diante de um verdadeiro milagre da natureza! Tire umas fotos que ficarei rico e, como você desejou, me mudo para bem longe desse bairro. Pelo menos assim, nunca mais verei essa sua cara de Fred Krueger. 
Minha sogra infelizmente está bem. 
Nunca mais você viu ela me xingando porque, Graças a Deus, ela extraiu quatro dentes e ficou impossibilitada de falar. 
Mas, não se engane, ela fala e me xinga bem menos que sua mulher faz com você quase todo dia. Semana passada filmei a briga de vocês e estou faturando horrores com o vídeo no YouTube. 
Sua dor de cotovelo é tão grande que, tem o desplante de criticar minha bela e aveludada voz. Saiba que cantamos as músicas sem errar a letra. 
Você que não conhece as canções e acha que cantamos errado. 
Aliás, obrigado pela plateia. 
Se eu ligo o liquidificador é porque sou acordado pelo seu maldito galo, todas as madrugadas. Diferente de você, que parece uma tripa e só come ovo, eu preciso me alimentar o tempo todo, inclusive quando acordo. Se livre desse galo infernal que eu prometo não ligar o liquidificador de madrugada. 
Antes eu de cueca que você com esses pijamas horrorosos com desenhos de ursinhos. Um homem dessa idade... Ridículo. 
Mais fácil o caminhão do lixo levar você que está um bagaço que eu, que sou um gordinho asseado e elegante. 
Por falar em contas, Zé do Gás andou te procurando. Parece que você deve dois botijões a ele. Melhor pagar porque senão, vai ter que usar os galhos do abacateiro para cozinhar. 
Termino esta carta desejando que seu galo vá para a panela de alguém, que seu filho arranje um jeito de pagar o que deve a minha filha, um pisão na unha encravada de sua esposa e que seu filho melhore das dores de cabeça que sua nora lhe dá. 
Atenciosamente, 
Primo Jesuíno”.

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