quarta-feira, 12 de outubro de 2022

O Pesadelo

 
Pense numa coisa desagradável é ter pesadelo... 
E noite passada tive um daqueles pesados.  
Acredite que, nesse malfadado sonho ruim, eu morava em um país onde o povo estava tão afundado na maré da ignorância que achava que ser vacinado era coisa ruim! 
Diziam que a vacina, ao invés de curar, ia trazer doença porque vinha da China e, como todos sabem, daquele país só vem coisa ruim e, de lá nada devemos usar ou aproveitar.  
Ah, e junto com a vacina, no auge tecnológico que só mesmo uma civilização super-hiper-mega-tera avançada conseguiria, seriam embutidos chips de altíssima tecnologia em nossa corrente sanguínea.  
Ou seja: a vacina serviria para tudo, menos para ser uma vacina.  
Mas, não para por aí. Neste medonho pesadelo, tinham pessoas que afirmavam por A mais B com comprovações científicas, que a ciência não existe; Que na lua, só foi São Jorge; Que dinossauros não existiram; Que a Terra não é redonda... Neste momento pensei que aquilo não poderia ser real e sim, um terrível pesadelo! Então gritei bem alto: 
- Meu Deus! Estarei eu na idade das trevas? 
Logo em seguida apareceu um advogado me entregando uma notificação de processo pois eu, homem negro desde que nasci, acabara de ofender toda a uma raça ao colocar a palavra “trevas” na mesma frase de uma coisa ruim afinal, trevas são negras e eu não poderia dizer que uma coisa ruim é negra.  
Ainda sem entender nada, recebi uma outra notificação de processo pois, havia colocado uma palavra feminina (idade) como exemplo de coisa ruim.  
Fui chamado de machista, racista, comunista, chapista e golpista.  
Tomei uma multa por não saber dirigir dada por um policial estacionado em fila dupla e com a carteira de motorista vencida.  
Neste mesmo pesadelo descobri que ler estava ficando fora de moda. Só liam as pessoas “lacradoras”, nerds e metidas a intelectuais.  
Assistir jornal só se fosse daqueles bem sensacionalistas onde o apresentador gosta mais de sangue que o Drácula.  
O negócio era se informar pelas poderosas e confiáveis redes sociais.  
- Se eu tenho YouTube e Youtubers, para que serve o velho William Bonner? Aquilo é um museu – me explicou, indignada, uma menina de cabelos azuis.  
- Se eu sei o que é um museu? Claro! É aquele lugar onde as famílias botam os velhos quando eles não servem mais para nada.  
Quando tentei explicar a diferença entre museu e asilo, a prestativa menina de cabelos azuis me informou que estava na hora do Big Brother.  
Neste sonhar amaldiçoado descobri que tinha gente pedindo e implorando para voltar aos prazerosos e pacíficos anos sessenta onde, éramos lindamente torturados e governados pelos militares que, segundo eles, estavam acima do bem e do mal, não eram corruptos, eram honestos e só maltratavam comunistas ateus e comedores de criancinhas.  
Argumentei que isso jamais aconteceria pois, o povo do meu amado Brasil varonil era inteligente o bastante para evitar aquele retrocesso.  
Foi quando fiquei sabendo que, naquele terrível pesadelo, já éramos governados por um capitão com atestado de doido e um vice, que era general e, não tinha atestado, mas duvidava- se de sua sanidade.  
Ministros saiam dos quartéis e eram especialistas em absolutamente nada. Não sei se admirava os militares porque deram um golpe inteligente, sem armas ou tanques, ou se me preocupava com o nível de inteligência da população. Cheguei a conclusão de que tudo não passava de falta de informação afinal, ler estava fora de moda.  
Pelo menos, livros não precisariam mais ser queimados.  
Fui ver essa tal de internet e fiquei atordoado: e não é que todas as informações estavam ali ao alcance de um click?  
Porque será que ninguém usava? 
Descobri também que dava para fazer mais sucesso e ser muito mais bem sucedido na vida, gravando vídeos falando bobagens, que escrevendo livros que ninguém iria ler.  
- Devem ser humoristas, estes tais de Youtubers – pensei.  
- Não tio, eles falam sério – me explicou a menina de cabelos não mais azuis e sim, rosas neste momento.  
Me explicou então por linhas tortas que, livro era papel e papel vinha de árvores. Para que derrubar árvores para fazer livros se era muito mais ecologicamente correto fazer um vídeo sem derrubar árvores? 
Estava quase concordando com a menina que, agora tinha os cabelos verdes quando, ela me disse que só valia a pena derrubar árvores se fosse para não entregar a Amazônia para os gringos afinal, era nossa e não deles. Aí era mais rápido e fácil queimar logo tudo.  
- Dos gringos não será jamais! E nossa bandeira que nunca será vermelha, vai trocar o verde pelo branco, que é muito mais elegante.  
Foi quando chamaram a menina de cabelos, agora roxos, de racista e ela chorou muito, não pela acusação mas, porque perdeu seguidores no Instagram.  
- E isso é assim tão importante? – perguntei no alto de minha ignorância.  
A menina, de cabelos laranjas, me olhou com raiva e perguntou meu nome para me excluir das redes sociais. 
Isso me magoou profundamente. Não porque ela estava me excluindo e nem porque tinha me aceitado sem sequer me conhecer mas, porque eu nem sabia que tinha Instagram.  
Chateado, vi a menina de cabelos dourados sumir em meio a uma manifestação contra um time de futebol que não ganhava para ninguém e a torcida queria a cabeça de alguém sei lá por quem.  
Sozinho, me belisquei afinal, não via a hora de acordar daquele doloroso pesadelo. O problema é que, quando acordei, percebi que tinha sonhado com a realidade.  
Fazer o que, né? Levantei e fui ver as mensagens no WhatsApp.

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