O carioca é da gema, o baiano é do dendê e o cearense, acredito eu que seja da rapadura.
Reginaldo é um cearense de nascimento, mas com raízes profundas na terra de Todos Os Santos, também conhecida como Bahia.
Consta que todos os brasileiros, incluindo aí os cearenses, são muito apaixonados por futebol, a versão brasileira do ópio do povo, diria o renomado filósofo Carlos Marximiliano, também conhecido pelos gringos como Karl Marx.
Reginaldo era torcedor apaixonado do Ceará Sporting, grande potência do futebol cearense e, até conhecido no cenário nacional.
Mas Maomé não pode viver da montanha que está no Ceará quando mora na Bahia assim como, para participar das resenhas futebolísticas da cidade de Salvador, ele não poderia ficar falando do Ceara Sporting, simplesmente porque para os baianos, esse time não importa muito.
Na Bahia só existem três opções de torcida: Bahia, Vitoria ou Bahia e algum time de fora e Vitoria e algum time de fora.
Reginaldo então optou pelo glorioso Leão da Barra Tradição, também conhecido como Esporte Clube Vitoria, e a ele se apegou e afeiçoou quase tanto quanto ao Ceara Sporting. Era como aquele cara que tem a mulher que ama em casa e a amante que adora na rua.
Desde o tempo do radinho de pilha que Reginaldo é visto a sofrer e vibrar com as partidas do Rubro-Negro Baiano. Mais sofrer que vibrar, diga-se de passagem, porque tem épocas em que ele só fala de vitória quando grita o nome do time, porque as derrotas costumam ser mais frequentes.
Hoje, Reginaldo não usa mais o radinho de pilha. Ele assiste aos jogos pela internet, por canal fechado ou, de vez em quando, vai ao estádio.
Mas, nunca abandona seu Vitoria, não importa em que divisão ou situação ele (o time) esteja. E pior: para o desespero de sua esposa, Tricolor de carteirinha, a paixão foi passada para os filhos do casal.
Paixão que, na verdade, não é tão grande pois as crianças jamais deixarão seus videogames de lado para assistir uma partida de futebol.
E onde entra o carioca da gema nesta história?
Excelente pergunta, que já te responderei.
Acontece que, por uma destas distorções geográficas que somente o futebol brasileiro pode causar, Reginaldo tem um amigo baiano que não está nem aí para a rivalidade entre a dupla Ba-Vi e resolveu torcer mesmo foi para o Flamengo.
Como eu disse anteriormente, Reginaldo as vezes assistia os jogos de seu querido Vitoria diretamente do estádio e, numa destas ocasiões, foi assistir ao confronto de seu Rubro-Negro de coração contra o time carioca para o qual o amigo torcia. E, juntando o vermelho ao preto e o útil ao agradável, resolveram de ir juntos.
Decidiram no palitinho em que lado do estádio assistiriam a partida e, mais por sorte que por perícia, Reginaldo venceu. E lá foram os dois para a torcida do Vitoria. Reginaldo trajava a camisa de seu time mas, por prudência, colocou uma jaqueta de mangas longas por cima. Já o amigo, por imprudência, foi apenas com a camisa do Flamengo no corpo.
E a bermuda, é claro.
O jogo começou e, logo no início, o Flamengo fez um a zero. Os simpáticos torcedores do Vitoria (porque todos sabemos que os baianos são simpáticos e hospitaleiros 24 horas por dia) começaram a, gentilmente, avisar ao amigo de Reginaldo que ele estava na torcida errada.
- Flamengo é do lado de lá, p*!
- Se o Vitoria tomar outro gol, a culpa é desse torcedor do Flamengo!
- Então a gente rasga essa camisa dele e damos porrada!
Preocupados com o excesso de gentileza dos simpáticos torcedores da equipe baiana, os dois amigos resolveram se retirar e ir para os lados da torcida do Flamengo. Reginaldo fechou o zíper de sua jaqueta e, no meio dos “cariocas”, continuou a assistir à partida.
Mas ocorreu que o Flamengo fez o segundo gol e, Reginaldo foi visto pulando e gritando junto com os torcedores do time carioca.
Tudo bem que ele teria que fingir estar torcendo para não ser hostilizado pela torcida, que era tão gentil e educada quanto a do Vitoria mas, era tanta euforia que causou estranheza.
O amigo então se aproximou para abraça-lo, acreditando em uma súbita conversão de Reginaldo, de um Rubro-Negro para outro.
Foi quando ouviu o que Reginaldo gritava em meio à multidão e entendeu o porquê de tanta euforia. O cearense gritava em alto e bom som, mas não tão alto que pudesse ser ouvido pelos demais ocupantes da arquibancada, as seguintes palavras:
- Tomou mais um goooooool! Time ruim dos infernos! Vai p* de time de merda! Antes eu ficasse torcendo só para o Ceara!
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