Os Exercícios

Rodinei olhou para o chão. 

Contrariado, percebeu que só conseguia enxergar as pontas dos dedos dos pés. Fora isso, somente via sua própria barriga. 

Olhou no espelho e mediu o tamanho de sua bochecha. 

- Estou parecendo um buldogue. 

Resolveu aproveitar que estava ali de pé e começar os exercícios que já planejava fazer a, pelo menos, duas semanas. 

Mas, na primeira vez que se curvou para tentar alcançar os pés com a ponta dos dedos, ouviu um barulho que mais parecia o som de um galho de árvore se quebrando. 

E, para piorar, não conseguiu mais se erguer. 

A mulher, muito contrariada e o filho, que se divertia com aquela situação, correram em seu socorro. 

Com a ajuda dos dois, Rodinei deitou-se na cama, apenas para ficar ainda mais contrariado pois, percebeu que deitado sua barriga parecia maior. 

- Se botar uma miniatura do Cristo Redentor aí em cima, vai ficar igualzinho ao Corcovado – falou aos risos, o filho. 

Rodinei ameaçou dar umas cacetadas no insolente mas, não conseguia se levantar para cumprir a ameaça. 

Na manhã seguinte, ainda contrariado com o tamanho da própria barriga, Rodinei resolveu voltar a tentar algum tipo de exercício. 

Deitou no chão e ensaiou abdominais. 

Colocou as mãos atrás da cabeça e fez esforço para levantar o corpo. 

Mas, para sua frustração, só conseguiu erguer o pescoço. 

O filho, que sentou em uma cadeira apenas para apreciar “o espetáculo”, vendo o pai sem conseguir se erguer, gritou:

- Mãe, traz um guindaste para levantar o papai do chão!

Lá de onde estava, a mãe respondeu:

- O que seu pai está fazendo desta vez?

- Está deitado no chão, parecendo um jabuti com o casco virado pra baixo. 

A vontade de dar um safanão naquele moleque insolente só não era maior que a dor que sentiu nas costas quando foi erguido pelos braços. 

Com o esforço, a mulher também deu um jeito na coluna e ambos passaram o resto do dia deitados na cama. 

Dois dias depois, ainda incomodado com volume da própria barriga, Rodinei tentou um novo tipo de exercício. 

- Vou fazer flexões. Isso não deve afetar minha coluna e nem me impedir de levantar depois. 

Deitou-se apoiado nos braços para começar e, logo percebeu que iria precisar vestir uma camisa pois, a barriga estava encostando no chão frio. 

Enquanto vestia-se, o filho entrou no quarto. 

- Não comece antes de eu chegar – falou animado – Preciso ver isso, para começar o dia feliz. 

Após jogar um sapato naquele moleque chato, começou as flexões. 

Desceu o corpo uma vez, subiu, desceu...e não só não subiu mais, como ainda bateu o queixo no chão quando desceu. 

O filho, as gargalhadas, caiu da cadeira onde sentou para “apreciar o espetáculo” que o pai proporcionava. 

- Deixe de graça e me ajude a levantar, seu palhaço. 

Com a recusa da mãe em auxiliar (“não vou ficar cheia de dores por causa desse velho maluco de novo”), o filho teve que se virar sozinho. 

Uma semana depois, já recuperado, Rodinei se convenceu de que, com ajuda profissional, conseguiria fazer os exercícios e, finalmente se livraria daquela incômoda barriga e voltaria finalmente a ver seus pés ( e outras coisas mais que, fazia tempo, não conseguia ver). 

Matriculou-se em uma academia e, escondido do filho pentelho, foi para seu primeiro dia de exercícios supervisionados. 

Uma hora depois, teve que ligar para que o moleque chato fosse buscá-lo pois, estava todo entrevado e não conseguia andar. 

- Desse jeito eu que vou abandonar a academia – ria o filho, enquanto o conduzia até o veículo – porque estou fazendo mais atividades te carregando do que malhando lá. 

A vontade de dar um tabefe era grande mas, Rodinei não conseguia erguer o braço e, tinha medo do filho derruba-lo. 

Teve que ficar um tempo de repouso, o que só fez aumentar o tamanho da maldita barriga. 

Agora, quando deitado, já não via nem as pontas dos dedos. 

Recuperado, tentou correr mas, quase enfarta. 

Partiu para caminhadas porém, teve que voltar de Uber pois os joelhos resolveram inchar e doer. 

Como último recurso, tentou uma dieta. 

- Agora, comendo tanta folha, se deitar com a pança para cima e não conseguir levantar, não vai faltar nada para ficar igualzinho a um jabuti. 

A dieta até que o fez perder algumas gramas mas, o levou para uma emergência, com sintomas de fraqueza e esgotamento físico. 

Após o atendimento emergencial, foi encaminhado até a sala para uma consulta com um médico. 

- Não vou mentir, Rodinei: seu problema é sedentarismo. Você está muito gordo e pesado. Tem que deixar essa moleza de lado e praticar exercícios. 

O filho, que o acompanhava, foi expulso do consultório porque não conseguia parar de rir, e a mãe que entrou em seu lugar, ameaçou o marido de divórcio se seguisse a orientação e o médico de processo, se tornasse a dar aquele tipo de conselho. 

O médico, sem entender o que acontecia, prescreveu um calmante para a mãe e um psiquiatra para o filho. 

Rodinei, cansado de tantas humilhações, desistiu de tentar enxergar os próprios pés, fez as pazes com sua barriga, reduziu a mesada do filho (que não achou isso engraçado), e hoje vive mais feliz e sem dores.