A Entrevista de Emprego

E lá foi Rolando para sua primeira entrevista de emprego. 

Fez tudo dentro dos conformes: acordou cedo, colocou sua melhor roupa e saiu de casa em um horário que permitisse chegar, pelo menos, meia hora antes que o marcado. Quando chegou, ainda no elevador, se olhou no espelho, ajeitou a roupa e os cabelos e, ficou satisfeito com o que estava vendo. Entrou na sala, identificou- se com a secretária e aguardou. 

Estava um pouco nervoso mas, nada que atrapalhasse.

Se preparou bastante para aquela entrevista e sabia que iria se sair bem. 

Logo chegou sua vez e foi encaminhado até uma elegante sala onde, um homem o aguardava com cara de poucos amigos. 

- Bom dia – cumprimentou, como mandam as boas maneiras. 

- Bom dia – respondeu o homem com cara de poucos amigos, nitidamente porque assim manda sua obrigação. 

Após todo o discurso explicativo de praxe, começaram as perguntas:

- O senhor é fluente em algum idioma?

- Domino o português e falo fluentemente o inglês – respondeu cheio de orgulho, Rolando. 

- Não começou bem – respondeu, cheio de tédio, o homem com cara de poucos amigos – precisamos de alguém fluente em mandarim, francês e baianês. Mas, sigamos em frente. 

Rolando ficou imaginando em que escola, faculdade ou curso teria que se matricular para ganhar fluência em baianês e, como seriam as aulas práticas. Entraria uma professora vestida de baiana de acarajé e diria:

- Repita comigo bem devagar: oooooxeeeee. 

- O senhor possui algum curso técnico? – falou o homem com cara de poucos amigos, interrompendo sua futura viagem ao Farol da Barra. 

- Sim, sim – respondeu novamente orgulhoso, Rolando. 

Fez uma lista de dezessete cursos de especialização que havia acumulado durante os anos e, quando terminou, olhou para o homem com cara de poucos amigos, cheio de satisfação. 

- Impressionante, mas nenhum serve para o que precisamos na empresa. Precisamos de alguém que possua um curso de mecatrônica, programação avançada, relações exteriores e seja fluente em libras. 

Rolando começou então a perceber que, não seria tão fácil assim conseguir aquela vaga de emprego. 

- Como o senhor está fisicamente?

- Me considero bem. Jogo futebol, basquete e faço caminhadas. Aos domingos corro na praia. 

- Não sei se é o suficiente. Precisamos de alguém que seja halterofilista, que tenha conhecimento em técnicas de capoeira e que seja especialista em arremesso de peso. 

Cada vez mais, Rolando se desanimava. 

- Em relação a saúde, o senhor tem algum problema?

- Nenhum! Sou completamente saudável, sem histórico de doenças e, segundo exames recentes, novinho em folha por dentro e por fora. 

O homem com cara de poucos amigos, balançou a cabeça negativamente. 

- Não sei se é o bastante. Precisamos de uma pessoa que tenha imunidade natural à doenças contagiosas, que seja doador universal e que nunca tenha tido uma febre na vida. 

- O senhor se considera mentalmente bem?

- Sim, com certeza!

- O senhor assinaria um termo se responsabilizando por sua sanidade antes, durante e depois de uma possível futura rescisão de contrato?

Meio desconfiado, Rolando respondeu:

- Creio que sim. Mas, qual o motivo dessa pergunta?

Pela primeira vez, o homem com cara de poucos amigos, sorriu. 

- Por nada em especial. Só faz parte da política da empresa. 

Sabe um sorriso que gela sua espinha, arrepia os cabelos dos braços e, seu instinto, sua intuição e até seu pai de santo te dizem que não é coisa boa que vem dali? Era o que aquele sorriso do homem com cara de poucos amigos, havia feito com Rolando.  

- Bom, isso é tudo. O senhor pode aguardar que entraremos em contato após verificar entre os candidatos, qual o mais qualificado. 

- A entrevista acabou? 

- Sim, senhor. 

Rolando se aproximou do homem com cara de poucos amigos e falou baixinho, como quem conta um segredo:

- Posso fazer uma pergunta extraoficial?

- Sim, pode.

- O senhor promete que isso não vai influenciar na seleção?

Pela primeira vez, o homem com cara de poucos amigos, mostrou interesse verdadeiro no que Rolando dizia. 

- Sim, prometo. 

 - Todos estes requisitos que a empresa exige...

- O que tem eles? – perguntou o homem com cara de poucos amigos que agora estava com cara de muita curiosidade. 

- Eu estou no setor certo? Estes requisitos não são para uma vaga de dublê, diplomata, astronauta ou algo do tipo?

Com um risinho divertido, o homem com cara de poucos amigos respondeu, com convicção:

- Pode ter certeza que o senhor está na entrevista certa. 

- Mas, tudo isso para trabalhar na recepção de um posto de saúde?

- Sabe que nós até reduzimos as exigências porque o último recepcionista saiu daqui de ambulância, direto para um manicômio, cantando o hino do Botafogo e gritando que preferia morar no Iraque do que continuar aqui?

Depois deste dia, Rolando procurou trabalhos mais simples e com menos exigências, como engenheiro nuclear na NASA.