quarta-feira, 12 de outubro de 2022

A Manifestação


A Associação dos Plantadores de Mandioca estava ativa naquele dia, em suas redes sociais: o grupo composto por seiscentas pessoas no whatsapp estava frenético. 
Como todos sabem, e se você não souber precisa se informar, os plantadores de mandioca não são apenas meros plantadores de mandioca. A classe reúne a nata da sociedade jurídica e intelectual do país. Plantadores de mandioca são advogados, juízes, contadores, políticos e, até mesmo, filósofos! Enfim o creme de lá creme social. 
E, especialmente hoje, todas essas grandes mentes pensantes e brilhantes estavam mobilizadas em torno de uma revolta comum. 
A prefeitura da fervilhante cidade de Santana do Acaraú, transitava um projeto de lei onde, a palavra mandioca seria proibida e substituída por macaxeira que, afinal, “condiz muito mais com a cultura da região que o termo mandioca, importado de uma tribo indígena que nunca habitou nosso extenso e rico território”.
 - Precisamos nos unir para evitar esse absurdo abuso de poder – escreveu indignado Joca Tatú, que não tinha cargo nenhum mas, entendia tudo de juridiquês Internético. 
- Com certeza! Não podemos permitir tamanha violação às leis vigentes e inerentes da nossa atividade – apoiou Zezinho Mandioqueiro, que havia feito um semestre na Faculdade de Direito local e, por isso, tinha ampla propriedade sobre o que dizia e, angariando várias palmas virtuais dos participantes do grupo. 
- Se faz necessário e urgente a organização do grupo como um todo para efetivarmos nossa necessidade de manter a autonomia nominal de nossa atividade laboral e produtiva – escreveu emocionado, Tonho do Aipim, que tinha muito respaldo para falar porque, já havia lido sete livros de filosofia e dois de psicologia. 
- O maior absurdo é esta tentativa absurda e descabida de banimento do termo mandioca com a clara intenção de excluir nossa bem-sucedida e próspera associação e substituí-la por alguma outra – alertou João Pereba, que um dia pretende cursar Direito para ser juiz, não de futebol e sim, de direito civil, penal e legal. 
- Mas essa vil e desleal tentativa é clara – concordou em grau, gênero, número e letra, Guaraci Guararape, renomado detetive particular e assíduo leitor de Sherlock Holmes e afins. 
- O importante é nos unirmos para evitar que este absurdo se concretize – proclamou Josué Piquete, que nunca foi sindicalista mas assistiu o filme de Lula dezessete vezes. 
- Reunião já! – escreveu em letras maiúsculas, Zeferina Lavradora que, assistia TV Senado para entender de política. 
- É vital nos reunirmos o mais brevemente possível para elaborarmos um documento que deixe claro nossa indignação com essa situação – reforçou Margarida Macarena, que entendia do assunto pois, já havia trabalhado na casa de Doutor Patrício Passarinho, o tabelião da cidade. 
- Processo já – convocou Tânia Tumulto, que nunca assistiu o filme de Lula mas, também era sindicalista. Só faltava ter um sindicato mas, isso era um mero e insignificante detalhe. 
Todos concordaram com figurinhas de apoio. 
Alguém postou algo sobre o clássico entre Fortaleza e Ceará, outro sobre o final do Big Brother e um terceiro publicou uma oração. 
- Alguém sabe como se começa esse processo? – perguntou de forma até pertinente, Juvêncio Jeguelerdo. 
Após um período de duas horas de silêncio, alguém respondeu:
- O correto mesmo é nos reunirmos para elaborar um documento que faça a prefeitura saber nossa força! Seu amigo de sempre, Vivaldo Vereador!
- E pra quando marcaremos essa reunião? – questionou Ana Questionilda.
Novo silêncio de sete horas. 
No dia seguinte, logo cedo, a conversa reiniciou. 
- O importante neste momento não é tanto quando nos reuniremos e sim, estabelecer os termos que iremos apresentar na ação que moveremos contra esse absurdo ditadorial – iniciou Guilherme Galego, famoso orador da cidade, outrora professor de português da escola primária e que, aprendeu a oratória enquanto coroinha do padre Bartolomeu Barril. 
- Concordo com o nobre colega de plantio! – opinou Mario Matraca, apenas para mostrar que também estava ali. 
- Sim, a conversa está linda e erudita – escreveu Charles Chato, o contestador, mal visto e estraga prazeres do grupo – mas atitude que é bom, como sempre, nada né?
As próximas cinco horas foram repletas de discussões, xingamentos, debates, trocas de experiências e muitas ironias e brigas. 
Enquanto as discussões aconteciam, as sugestões surgiam e nada era resolvido, a prefeitura finalmente aprovou e sancionou, em tempo recorde, a lei orgânica número 123.456.879-45 que proibia “de forma irrevogável o uso do termo mandioca, seja por plantadores, associações ou qualquer outra forma de designação comercial”.
Indignação geral no grupo da Associação dos Plantadores de Mandioca que gerou mais doze dias de calorosos debates entre os membros no intuito de decidir quais ações poderiam ser tomadas. 
Duas conclusões foram tiradas:
1 - A culpa era de Charles Chato, que foi devidamente banido do grupo pois, seus questionamentos causaram o atraso na definição das atitudes a serem tomadas pela Associação;
2 – Se fazia necessário uma reunião dos membros para resolver o que poderia ser feito para solucionar aquela pendência. 
Em meio às discussões, Silvio Sem Noção, abordou um tema ainda mais importante para a comunidade em geral:
- Alguém sabe me informar porque a Charlene Charlatã está vendendo a farinha de MACAXEIRA, mais barato que todo mundo?
A partir daí, uma nova rodada de discussões foi iniciada para debater que providências seriam tomadas e, foi decidido que uma reunião seria marcada para decidir que decisão seria tomada em relação a esse tema. 
O decreto da prefeitura?
Foi deixado pra lá e a única providência tomada foi modificar o nome para Associação dos Plantadores de Macaxeira e Termos Semelhantes. 
Pelo menos até marcarem uma reunião para decidir se vão manter mesmo este nome.

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