Coisas Estranhas

“Acredite se quiser mas, meu dia hoje foi sinistro. 

Ainda durante a noite, luzes fortes e coloridas invadiram meu quarto. Olhei pela janela e quase desmaiei: lá estava, girando feito cabeça de bêbado, um imenso disco voador. 

O bicho era enorme mesmo! Parecia um capacete de cearense. 

Não sei se passou no jornal porque, assim que o bicho sumiu, caiu um relâmpago bem em cima da antena de televisão lá de casa. 

Foi um estrondo pior que peido de velho! 

E aquela claridade, tipo a iluminação da Barra em noite de ano novo...

A carga elétrica foi tão grande que apaguei mais rápido que vela em dia de vento forte e, quando acordei estava com o corpo mais mole que vida de participante de Big Brother e os cabelos mais arrepiados que quando assisto filme de terror meia noite e a panela cai na cozinha. 

Mas, para mim, a responsabilidade está acima de tudo e, quando vi no relógio que estava mais atrasado que Barrichello na linha de chegada, corri para me arrumar afinal, precisava trabalhar. 

Ao entrar no banheiro, outra surpresa: em vez da lagartixa que sempre está por lá, tinha um jacaré com a boca aberta me esperando. 

Peguei o barbeador e, tal qual um Tarzan moderno, caí pra dentro do bicho! Lutamos ferozmente e só consegui vencer por dois motivos:

1 consegui jogar nele o frasco inteiro do perfume de minha filha, o que fez o bicho espirrar mais que taco de bêbado jogando sinuca e o fez fugir desesperado dali e;

2 minha determinação de, atrasado ou não, chegar até o trabalho. 

Após esta luta, parei um pouco para respirar e, finalmente tomei banho. 

Tomei um café e corri para o ponto de ônibus pois, descobri que o tanque de meu carro estava mais vazio que barriga de pobre na segunda feira após fazer um churrasco no domingo. 

Caminhei durante quarenta minutos pois, tive que parar para ajudar os bombeiros a combater um incêndio, a polícia a perseguir um ladrão que tentou me roubar o celular e, para completar, ajudei a SAMU com o parto de uma senhora de oitenta e quatro anos, cuja complexidade da situação estava acima das capacidades e experiência do médico que ali se encontrava e eu, experiente nestes assuntos pois já fiz curso de bombeiro civil, sou corredor de cem metros rasos e fiz umas aulas online de partos geriátricos, não poderia me negar a fornecer estas ajudas. 

Pois bem, após todos estes acontecimentos, finalmente consegui embarcar no transporte coletivo. 

Atrasado que estava, torci para que o trânsito estivesse tranquilo mas, como o dia havia começado estranho, estranho continuaria. 

Acredite se quiser mas, fomos parados por sete blitz policiais, o motorista enfartou e, após eu ter que dirigir o veículo até o hospital, tivemos que esperar a empresa mandar outro motorista. 

Quando ele chegou, retomamos a viagem porém, após poucos metros percorridos, eis que o motor do ônibus, talvez não tendo resistido à velocidade mais alta que o salário acabando, que coloquei no acelerador para socorrer o motorista, pifou. 

Tive que, para não me atrasar ainda mais, usar meus dotes como mecânico para consertar o coletivo e podermos finalmente seguir viagem. 

Quando finalmente cheguei ao meu destino, após ser mais aplaudido que entregador de pizza em casa de faminto, resolvi ir ao banheiro trocar as roupas que, depois de tanta coisa, se encontravam mais suadas que sovaco de pião de obra ao meio-dia. 

Lá chegando, tive que fazer uso dos quatorze tipos de artes marciais que domino, para impedir um tarado de se aproveitar de uma pobre moça. 

Após a surra que dei nele, fiquei aguardando a polícia chegar e, utilizando o aprendizado em uma faculdade não concluída de psicologia, consolei a pobre vítima. 

Os policiais inclusive, sabendo de todos os meus feitos neste dia, me levaram até a prefeitura para que eu fosse homenageado. 

Fui só para não fazer desfeita ao prefeito pois, não tinha esquecido que ainda estava atrasado e, como sou mais responsável pelo meu trabalho que político por desvio de dinheiro, não aceitei participar da enorme cerimônia que ele queria fazer. 

Corri então para o trabalho pensando que talvez, o disco voador ou o relâmpago, tenham sido sinais de que nesta manhã eu seria capaz de realizar grandes feitos e, por isso, todas estas coisas tenham acontecido. 

Mas, de qualquer forma, espero que tenha ficado claro os motivos de eu só ter conseguido chegar aqui no escritório agora, às treze horas”. 

Gumercindo, o patrão, após ouvir boquiaberto o relato de Frederico, apenas comentou:

“ Eu vi em suas redes sociais que você ficou até a madrugada em uma festa e, nas redes de seus amigos, que você estava de ressaca na praia pela manhã. Eu estava pronto para te dar uma suspensão mas, depois de ouvir tanta criatividade, estou em dúvida se te suspendo ou se te transfiro para o setor de marketing”.