sexta-feira, 14 de outubro de 2022

O Cadeado



Já ouvi falar muito que botijão de gás só esvazia na pior hora possível. 
Na verdade, até já senti na pele isso. 
Domingo de manhã, feijão no fogo e o maldito do gás simplesmente termina. E, para piorar, sempre termina quando estamos sem dinheiro. 
Mas, hoje não estou aqui para falar de botijão de gás, que todo mundo já sabe que só acaba nestas situações, e sim, de outra coisa inconveniente que ninguém nunca percebeu: o cadeado. 
É aquele tipo de coisa que acontece e ninguém nota. 
Tipo alho. Vocês já viram que absurdo é o preço desse troço?
Uma cabeça de alho custa mais ou menos o preço de um Fiat Uno, daqueles modelos antigos. Mas, como é por peso, ninguém se toca do absurdo que é isso. 
Mas voltando ao cadeado, o de meu portão resolveu emperrar em um momento pior que o botijão quando acaba. 
Era uma segunda-feira pela manhã, quando eu saia para comprar pão, antes de ir trabalhar. 
Coloquei a chave no bendito cadeado e girei. 
Girei o dedo, porque a chave, essa nem saiu do lugar. O bicho travou de tal forma que ficou mais duro do que trabalhador no meio do mês. 
Forcei pra lá, forcei pra cá e nada da chave girar. 
Depois de uns dez minutos tentando, finalmente consegui destrancar o bendito cadeado. Por via das dúvidas, lubrifiquei o bicho com óleo de máquina, antes de correr já atrasado, para a padaria. 
Após passar mais uns vinte minutos na fila e voltar ainda mais atrasado para casa, coloquei novamente a chave no cadeado, girei e... nada!
Mais uma vez o maldito cadeado travou e eu, a cada minuto mais atrasado, não conseguia destrancar. 
Girei com mais força e, finalmente consegui... quebrar a chave dentro do bendito cadeado! Fiquei uns dois minutos com o pedaço da chave na mão, sem ação, incrédulo e sem saber o que fazer. 
Como não iria adiantar xingar e, chorar não pegaria bem para um homem de minha idade, acabei por tomar uma atitude: pulei o portão. 
O problema é que, o processo não foi tão simples como fiz parecer. 
A calça que eu estava usando era um jeans bem justo e o tênis estava com o solado lisinho de tão desgastado. Por este motivo, o tal calçado derrapou justamente quando eu passava uma das pernas por cima do portão, o que causou além de um belo rasgão no fundo da calça, uma queda de minha pessoa, de bunda no chão. 
Levantei contrariado e percebi que, além da calça, o saco com os pães também tinha rasgado fazendo com que, além de tudo, eu ainda tivesse que sair com fome. 
Tomei outro banho, troquei de roupa e saí, definitivamente atrasado, para o trabalho. Novamente pulei o portão, desta vez sem cair, e fui trabalhar. 
Na volta, já pela noite, resolvi comprar um novo cadeado e, foi neste momento que lembrei do botijão de gás e das cabeças de alho. 
Vocês acreditam que me cobraram VINTE REAIS em um cadeado médio?
VINTE REAIS!
Tentei explicar ao vendedor que eu queria apenas um cadeado e não uma fechadura para o cofre da Casa da Moeda mas, o cidadão impiedoso e inflexível, respondeu que, se eu não quisesse pagar pelo cadeado, podia fechar o portão usando um pedaço de barbante ou um durex. 
Para evitar colocar a pobre progenitora dele na conversa, resolvi procurar em outro lugar, apenas para descobrir que existe um cartel controlando o preço dos malditos fechadores de portão. 
Todo lugar em que eu fui, ouvi o mesmo valor: vinte reais. 
Resignado e desanimado, acabei por comprar um de uma marca mais famosa por este preço mesmo.
Não direi aqui qual foi a marca porque me recuso a ajudar na divulgação de quem me tira vinte reais do bolso sem fazer nenhum esforço. 
Voltei para casa, com o cadeado que comprei a preço de ouro no bolso e, após pular novamente o portão, peguei um martelo e descarreguei todo meu ódio batendo no cadeado antigo. Após arrombar o dito cujo, coloquei o cadeado novo e resolvi meu problema. 
Isso tudo aconteceu a três meses atrás.  
Então porque estou contando isso agora?
Porque estou de pé, molhado de chuva, na frente do vendedor que, sorridente, está me informando que o preço do cadeado aumentou para vinte e cinco reais. 
O ordinário do cadeado que eu havia comprado emperrou igualzinho ao anterior e, numa noite chuvosa de domingo, sem outro comércio aberto, fui obrigado a comprar lá, mesmo tendo a certeza que o vendedor aumentou o preço só para se vingar. 
- Agora você vai pagar “caro” por um produto de qualidade – falou com o sorriso ainda mais largo e um ar de ironia no rosto, o vendedor. 
Para evitar um problema maior, sai com o cadeado de vinte e cinco reais no bolso e fui, mais uma vez, descarregar o ódio com meu martelo.

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