quarta-feira, 12 de outubro de 2022

O Jiló


Dona Hermenegilda mandou chamar o filho, Toinzinho, de quinze anos que estava perambulando pela rua. 
Toinzinho, muito a contragosto, largou o taco de sinuca e foi ver o que a mãe queria. 
- Toinzinho, eu preciso que você me compre um jiló. 
- Tem que ser agora? Estava tão ocupado...
Maldita hora em que o rapaz se atreveu a dizer essa frase. 
Dona Hermenegilda, chorosa, passou a alegar tudo que havia feito pelo filho ingrato, desde o nascimento até o dia de hoje. 
Foi um sermão de aproximadamente quarenta minutos onde, Toinzinho chegou até a cochilar. 
Toinzinho resolveu então acabar logo com aquele tormento e saiu para comprar o bendito jiló. 
Primeiro foi na mercearia de seu Irineu Pirilampo, porque era a mais próxima de casa. 
Achou o preço muito alto. Um absurdo! 
- Isso é um jiló ou um botijão de gás?
Toinzinho tinha herdado da mãe o dom da pechincharia. 
Irredutível, Irineu Pirilampo não aceitou baixar um único centavo. 
Entre a preguiça e a economia, logicamente Toinzinho optou por procurar o tal do jiló em outro lugar. 
Foi até o mercadinho de Zequinha Temdetudo, porque era o segundo mais perto de sua casa e vendia mais barato. 
- Seu Zequinha, quanto tá o jiló?
- O quilo, a dúzia ou a unidade?
- A unidade. 
- Eu não vendo a unidade. 
- Então quanto custa a dúzia?
- Também não vendo a dúzia. 
Já contrariado, Toinzinho perguntou:
- E o quilo, o senhor vende?
- Vendo. 
- E quanto é?
- Eu vendo, mas não tem. 
Para não desrespeitar uma pessoa “de idade”, Toinzinho preferiu não comentar e foi até a quitanda de Moisés Merceeiro. 
Já escolado, Toinzinho foi logo perguntando:
- Tem jiló, seu Moisés?
- Bom dia, meu filho. Eita geração mal educada!
- Bom dia, – respondeu irritado, Toinzinho – tem ou não tem o jiló?
- Espera que eu vou ver. 
Vinte e cinco minutos depois, após atender o telefone, negociar o preço dos tomates, passar um sermão no funcionário que derrubou a farinha, enxotar um cachorro e paquerar uma cliente, Moisés Merceeiro voltou com a resposta que Toinzinho não esperava:
- Tem não. 
Após respirar fundo, Toinzinho foi até a visgueira de Chico do Charque. 
- Bom dia, seu Chico. O senhor por acaso tem jiló para vender? Compro tanto faz se for por quilo, dúzia, unidade ou qualquer outra forma que o senhor queira vender. 
- Jiló? Porque alguém iria querer comer uma porcaria dessas? Aqui só vendo coisa boa! Quer tomate? Cebola? Pimentão? Isso eu tenho! Jiló me recuso a vender!
Achando que era muito mais fácil simplesmente ter dito que não tinha, Toinzinho saiu em direção ao supermercado. 
No supermercado um sorridente, mas meio lerdo, funcionário explicou que o dia das frutas, legumes, verduras e hortaliças era às quintas feiras. 
Sabendo que já era sexta feira e sua mãe não iria esperar uma semana pelo maldito jiló, não teve opção a não ser voltar para a mercearia de Irineu Pirilampo. 
Lá, após quinze minutos de negociações, stress, xingamentos, ameaças e chantagens, Toinzinho conseguiu um jiló murcho um pouco mais barato. 
Sabendo que já havia perdido a partida de sinuca, cansado, suando feito um cuscuz e morrendo de sede, Toinzinho caminhou vagarosamente de volta para casa e, lá chegando, entregou o pacote com o jiló para a mãe. 
Dona Hermenegilda, inexplicavelmente, ficou furiosa quando abriu o pacote e viu o que tinha dentro. 
- Mas que porcaria é essa? A gente dá uma tarefa simples e o retardado ainda faz errado!
- Mas, mãe – falou ofendido, Toinzinho – eu não tenho culpa se o jiló está murcho! A senhora tem que reclamar com o Irineu Pirilampo!
- E desde quando Irineu vende jiló, seu lerdo?
 - Desde sempre, ué...
- Jiló vende é na farmácia de Bitonho dos Remédios!
Confuso, Toinzinho começou a achar que sua mãe estava caducando. 
- Desde quando jiló vende em farmácia? Verdura vende é em mercearia...
- E jiló lá é verdura? Eu vou passar verdura em minha perna inchada?
- Agora foi que deu! Passar jiló na perna?
- Claro, seu lesado! Jiló é para passar nessas coisas mesmo. 
Impaciente com a cara de idiota do filho, Dona Hermenegilda abriu uma gaveta, tirou uma embalagem e, praticamente esfregou na cara dele. 
- É esse aqui! Esse é o jiló que eu mandei você comprar!
Toinzinho pegou a embalagem e lá estava escrito:
Bálsamo Gelol.

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