sexta-feira, 14 de outubro de 2022

O Sapato e a Promessa



Falando mais uma vez sobre sapatos, lembrei de outra história envolvendo os ditos cujos porém, essa não aconteceu comigo. 
Mas, como sempre, juro que aconteceu de verdade. 
Consta que Menelau começou a trabalhar em uma sapataria e, num momento do qual iria se arrepender amargamente, resolveu prometer ao Tininho, seu sobrinho, que traria para presenteá-lo aquele tênis bem legal que vivia aparecendo nas propagandas da TV. 
Porém, o que Menelau esqueceu de explicar é que, mesmo trabalhando em tal loja, era necessário primeiro receber um salário para, somente depois, conseguir cumprir a promessa. 
Pois é, e ainda faltavam vinte e nove dias para que o tal “faz-me rir” caísse na conta. O difícil seria explicar isso para Tininho. 
No dia seguinte a promessa, quando Menelau estava saindo de casa para o trabalho, tentando ser o mais silencioso possível, eis que ouviu aquela voz fininha de criança, vinda de dentro de um dos quartos:
- Não esqueça meu sapato!
Menelau riu da inocência infantil e seguiu seu dia. 
Ao voltar, no comecinho da noite, lá estava Tininho sentado na porta a aguardar ansioso. 
Com os olhos mareados, pelo desapontamento da pobre criança, Menelau explicou tintim por tintim o motivo pelo qual não teria como trazer o tal do tênis, pelo menos até o final do mês. 
Ao fim da explicação, Tininho apenas perguntou:
- Então você não trouxe hoje?
Na manhã seguinte, quando já estava trancando o portão, Menelau ouviu mais uma vez a vozinha de criança:
- Não esqueça meu sapato!
Ao voltar, novamente Tininho estava sentado a esperar. 
Mais uma vez, Menelau explicou a Tininho o motivo de não ter trazido o prometido tênis e, desta vez o menino perguntou:
- E não pode pagar depois?
Menelau admitiu para si mesmo não ter sequer pensado naquela possibilidade e resolveu que, para resolver aquela questão que estava se tornando embaraçosa, iria ver se conseguiria o tal “fiado”. 
Porém, preferiu não comentar nada com Tininho. 
O que se mostrou um acerto pois, a política da empresa não permitia que funcionários novos efetuassem tal forma de compra. 
Ao voltar para casa, lá estava Tininho novamente a esperar. 
- Hoje você trouxe o meu sapato?
E, nos vinte e tantos dias seguintes, esse ritual se repetia. 
Menelau já se encontrava aflito. 
Tentou até chegar mais tarde em casa, sem sucesso. 
Não importava em qual horário ele chegasse, Tininho estava esperando. 
Pela manhã não era diferente: independente de quando saísse de casa, Menelau sempre ouvia aquela voz fininha de criança a lembrar:
- Não esqueça meu sapato!
A coisa já estava em um ponto onde, o pobre Menelau, trabalhava mais preocupado em receber o dinheiro e comprar o bendito tênis que em pagar suas próprias contas. 
Pensou até em pedir um dinheiro emprestado a alguém, somente para se ver livre daquele “compromisso”, atitude logo reprovada pela mãe:
- Você vai pagar juros de empréstimo porque esse menino não quer esperar alguns dias por um tênis?
Menelau até concordou mas, ainda assim, não conseguia convencer Tininho a parar de perguntar duas vezes por dia pelo bendito tênis. 
Até dormindo, Menelau ouvia a voz de Tininho em seus sonhos a dizer:
- Cadê meu tênis?
Assim passaram lentamente os dias até que, finalmente chegou o dia de receber o salário. 
Quando saiu pela manhã, ao ouvir o lembrete de todo dia, pode finalmente responder:
- Hoje a noite eu trago!
Trabalhou contando as horas para o expediente terminar. 
Aliás, assim que chegou na sapataria, antes mesmo de atender qualquer cliente, Menelau escolheu logo o tênis de Tininho. 
Ao final do dia, lá foi Menelau feliz e aliviado com um par de tênis embrulhado debaixo do braço. 
Ao chegar em casa, lá estava Tininho sentado no mesmo lugar de sempre. 
- Trouxe? – perguntou ansioso, o menino. 
- Trouxe! – respondeu satisfeito, Menelau. 
Aos gritos de felicidade, a criança abriu a embalagem e calçou os tênis para, logo em seguida, ficar a olha-los com ar pensativo. 
- Que foi? Não gostou? – perguntou agoniado, Menelau. 
- Do tênis eu gostei...
- Então?
- É que o que eu queria mesmo era a caixa, para guardar meus carrinhos e estou achando que essa é muito pequena e não vai caber.

Nenhum comentário:

Postar um comentário

Felicitações

A primeira mensagem chegou antes das sete da manhã.  - Felicidades, minha amiga! Que dure para sempre! Como a Almerinda sempre foi meio desc...