quarta-feira, 12 de outubro de 2022

O Serrão e o Vereador


Você sabe o que é um serrão?
Serrão é aquele sujeito que, tudo que você consome, ele quer um pouco.
Comprou uma cerveja? O serrão aparece com um copo. 
Pediu uma pizza? O serrão surge com um prato. 
Vai viajar? O serrão aparece com uma mochila. 
Precisou usar um colírio? O serrão brota com o olho ardendo. 
Tem um trabalho a fazer? O serrão desaparece. 
Detalhe: serrão que é serrão, nunca paga um centavo sequer de conta nenhuma. O serrão vai “serrar” sua cerveja, sua pizza, uma carona no seu carro, seu colírio e qualquer outra coisa que você consuma sem contribuir com absolutamente nada. 
“ Pago na próxima”, “esqueci a carteira”, “ minha mulher pegou meu cartão”... Qualquer uma destas frases serve para consumir às suas custas. 
O serrão também pode ficar horas mexendo na carteira, na mochila, ou na bolsa, se for serrona, apenas para disfarçar enquanto os outros pagam a conta. Costumam andar também com notas de cem, apenas para justificar o porque de não poderem contribuir. 
- O dinheiro está “ inteiro”. Na próxima eu pago. 
O serrão é tão presente que, até uma música em sua homenagem já existe! Podem procurar nos YouTubes da vida, uma canção do nosso querido Martinho da Vila chamada Na Aba. 
É uma verdadeira “homenagem” a esse tipo de sujeito. 
Mas é em época de eleições que o serrão se esbalda. 
Serrão que se respeita é assessor ou cabo eleitoral de vereador. 
É a oportunidade perfeita para o serrão amador se tornar profissional e o serrão profissional mostrar todo o seu talento. 
O vereador está no palanque discursando? O serrão está ao lado gritando:
- Bravo! Esse é o homem!
O vereador espirra? O serrão está lá para aplaudir e gritar:
- Bravo! Esse é o homem!
A eleição é a época onde o serrão serra e ainda é pago para serrar. 
Eleições são o paraíso dos serrões. 
E canguinha, você sabe o que é?
Canguinha é o sujeito casquinha, mão fechada, mão de figa, muquirana, o cara que anda com um escorpião no bolso e um cadeado na carteira, somente para não gastar dinheiro. 
Não confundir o canguinha com o serrão. O serrão não gasta porque quer levar a melhor sobre os outros. Ele quer comer e beber sem gastar apenas porque acha que as outras pessoas devem pagar pra ele. 
O canguinha não gasta porque não gosta de ver seu dinheiro saindo da carteira. O bom canguinha não fica “na aba” de ninguém: ele simplesmente não vai aos lugares para não gastar e, quando vai, gasta o mínimo possível. 
O serrão bebe a cerveja dos outros sem pagar; o canguinha bebe um copo de água, para não gastar. Canguinhas e serrões são inimigos naturais. 
Cornélio é um serrão profissional; Praxedes é um canguinha diplomado. 
Por uma destas ironias da vida, Praxedes se candidatou a vereador (com o slogan: economizar para crescer) e, Cornélio era o assessor. 
No primeiro dia de campanha, após um comício, depois de muitos “bravos, esse é o homem”, Cornélio estava louco por umas cervejas. 
Mas Praxedes que, queria economizar para crescer, não parecia disposto a bancar tal extravagância. 
Como um serrão de longa data, Cornélio aconselhou Praxedes:
- Comício que é comício, comício raiz, comício de sucesso, tem que terminar com os eleitores e o candidato confraternizando no bar, acompanhados por umas cervejinhas bem geladas. 
- Você tem certeza? Afinal, gastar com cerveja não combina com o meu slogan de campanha – falou o mão de figa avarento, já sentindo câimbras na mão e dores no coração. 
Após muita lábia, bajulação e até estudos científicos sendo citados, Cornélio convenceu Praxedes a levar sua comitiva de serrões, puxa sacos e potenciais eleitores, para o bar de Epaminondas, que pertencia a uma outra classe de pessoas: os ressabiados. 
Ressabiado é o cidadão que, de tanto ser passado para trás, desconfia da humanidade, do inferno e até mesmo do céu. 
Ressabiados são inimigos naturais dos serrões e dos canguinhas. 
Ao ver aquela multidão, liderada por um serrão e um canguinha, foi logo usando a frase preferida, mantra e lema dos ressabiados:
- Não vendo fiado!
- Não se preocupe com isso! Ali sentado em meio à multidão está o seu, o meu, o nosso futuro vereador e quiçá próximo Presidente da República, o grande, fenomenal e incrível Praxedes – anunciou o Cornélio, o serrão, aos gritos, para que Praxedes, o canguinha ouvisse e isso convencesse Epaminondas, o ressabiado. 
Desconfiado de que isso não queria dizer absolutamente nada mas, sem muitos argumentos para uma negativa, Epaminondas não viu outra opção a não ser vender tudo que a multidão solicitasse. 
Foi um dia histórico! Por horas e horas, os partidários de Praxedes comeram, beberam, cantaram e dançaram. 
Foi o momento mais sublime na história eleitoral da cidade. 
Praxedes foi aclamado aos gritos de “já ganhou” e “lenda” pela multidão. 
Já Cornélio, se sentia o rei dos serrões afinal, estava conseguindo serrar uma fortuna de um canguinha, seu inimigo natural. 
Mas infelizmente, toda farra tem um fim e toda festa tem uma conta a ser paga. E Epaminondas preocupado, não demorou a trazê-la quando a gastança finalmente terminou. 
- Não sou eu que vou pagar – falou animadamente, Cornélio – a festa foi patrocinada pelo nosso futuro vereador. 
- Interessante – ponderou, Epaminondas – há coisa de duas horas atrás, seu futuro vereador pagou uma garrafinha de água e um pacotinho de amendoim e disse que, como a ideia foi sua, você pagaria a conta. 
Serrão que é serrão, sempre tem um dinheiro guardado mas acha um desaforo ser serrado e ter que pagar por algo que serrou. 
- Deve haver algum engano, com certeza. O vereador Praxedes é um brincalhão e deve ter feito isso para pregar uma peça na gente – falou o serrão, já levantando da mesa e se dirigindo a saída – tenho certeza que amanhã ele passará aqui e acertará está conta. 
Sem perder a calma, Epaminondas colocou a mão sobre o ombro de Cornélio e falou:
- Nesse caso, o distinto amigo não pode ir embora desta forma! Não sem antes ver a Lolita cantar! 
- Que coisa maravilhosa – falou desconfiado, Cornélio – ainda teremos um show de música! Mas, onde está Lollita, a cantora, que não a vejo?
- Lollita é aquela tora de madeira encostada ali no balcão! E ela vai cantar direitinho em suas costas se você não me pagar essa conta agora!
Sem opções, Cornélio pagou a conta com lágrimas nos olhos e, nunca mais fez campanha para Praxedes, o canguinha. 
Praxedes não ganhou a eleição mas, ficou famoso por ter sido o único candidato no país que não estourou o orçamento e as verbas de campanha. Apesar disso, teve dois votos: o seu próprio e o de Epaminondas, o ressabiado, como agradecimento por tão lucrativo dia. 
Já este histórico dia, ficou conhecido internacionalmente como aquele em que, um serrão foi serrado por um canguinha.

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