Valéria Valentia não era delicada.
Nem um pouco delicada.
Conhecida por não ter medo de cara feia e, dizem as línguas do povo, ser descendente de Maria Bonita, Valéria Valentia não era chegada a frescuras e carinhos.
Por isso mesmo não era vista com namoricos desde 1991 quando, após descobrir estar sendo traída por Ciro Cínico, ganhou sua fama de valente ao colocar para correr Ciro, Sandra Saidinha, a amante, o pai da mesma, o pai do cínico Ciro e até mesmo o cachorro Pitbull de Sandra, sozinha e munida apenas de um cortador de unhas.
Os homens até reconheciam sua grande beleza mas, tinham medo da moça.
Não que ela se importasse.
Não mesmo. Valéria Valentia tinha mais o que fazer do que ficar de desfrutes com aqueles frouxos da cidade.
Edson Exibido gostava de mostrar que era “o tal”.
Comprou um carro, rebaixou o possante e colocou luz neon em tudo quanto era lugar que fosse possível colocar.
A noite, parecia um disco voador voando baixo pelas ruas da cidade.
Tão baixo que ficou impraticável.
Nas ruas esburacadas e lotadas de quebra molas, o “disco voador” de Edson, levava em torno de duas horas um trajeto que uma pessoa a pé faria em dez minutos.
Por isso, o Exibido comprou uma motocicleta verde limão com detalhes em vermelho, escapamento furado para fazer bastante barulho e de fácil aceleração.
A noite, ele parava a moto na praça e acelerava sem sair do lugar apenas para fazer aquele som característico que, no fundo, desagradava até o próprio Edson.
Durante o dia, passava as muitas horas livres “empinando” a motocicleta pelas ruas.
Por coincidência (ou não) uma das vias onde o Exibido mais gostava de se exibir era justamente onde morava Valéria Valentia.
E, como dizia o pastor, aí é que estava o mistério: toda vez que o Exibido se exibia, a Valentia ia para a janela olhar atenta para tais peripécias.
Ninguém entendia o porque de, entre tantos homens mais promissores, Valéria parecia mostrar interesse justamente naquele sujeito.
Edson, que não era cego e nem bobo, já havia percebido os olhares da bela e arredia moça para suas proezas motociclísticas e, por isso mesmo, passou a fazer das suas peraltices cada vez mais na rua onde ela morava.
Com o tempo, para desespero dos vizinhos, Edson Exibido transformou a prática em rotina: todos os dias mais ou menos no mesmo horário, a motocicleta surgia com manobras cada vez mais arriscadas e ousadas.
E, todos os dias Valéria Valentia lá estava, em sua janela a observar.
Leôncio Lerdeza era o único amigo em comum que eles tinham e, por isso, o Exibido naturalmente o procurou para “intermediar” um futuro encontro.
Mas, tão grande quanto o barulho que sua moto faz, foi a surpresa com a resposta do amigo Lerdeza.
- Acho melhor não. Para o bem de sua saúde, sabe?
Sem entender, o Exibido explicou de forma clara a fascinação da moça pelas suas proezas em duas rodas e como ela o enamorava com os olhos todas as tardes.
Lerdeza, com toda sua lentidão, então explicou:
- Valéria Valentia vai todos os dias para a janela ver você “empinar” e torcer...
- Isso!
- ... para você cair e se arrebentar todo. Inclusive, ela tem um porrete com seu nome pintado que é para o dia que te encontrar na rua, sem a moto.
Misteriosamente, para a felicidade da vizinhança, a partir deste dia Edson Exibido e sua discreta motocicleta nunca mais foram vistos nas imediações da Rua Rosa Rasa, onde residia Valéria Valentia, a mulher que batizava porretes e espantava motoqueiros.
Nenhum comentário:
Postar um comentário