quarta-feira, 12 de outubro de 2022

Pescar Para Economizar


Essa, que eu juro que é verdade apesar de não ser, aconteceu em uma Quinta Feira Santa. 
Curisvaldo Canguinha não se conformava em, todo santo ano na Sexta-Feiira Santa, gastar seu santo dinheirinho com um almoço onde comprava peixes por um preço que, de santo, não tinham nada. 
- Pois esse ano não vou dar osadia para peixaria!
Procurou no meio das suas tranqueiras a velha vara de pescar, o anzol e as iscas e partiu até o rio das Corocas, maior ponto de pesca da região. 
Jogou o anzol e ficou aguardando algum peixe se voluntariar para participar de seu santo almoço no dia seguinte. 
Passaram-se dez, vinte, trinta minutos e nada. 
Curisvaldo Canguinha até cochilou e só acordou quando perdeu o equilíbrio e caiu dentro do rio. 
Após alguns palavrões, voltou a margem e, novamente jogou o anzol. 
Desta vez porém sentiu que, ao puxar a vara, ela apresentou resistência. 
Eufórico, Canguinha já imaginava a moqueca que iria fazer com aquele pescado que, com certeza, não deixaria escapar. 
Puxou com toda força até que ouviu um estalo. 
Era sua coluna que não aguentou o esforço. 
Curisvaldo, mesmo sentindo dor, pensou na economia que iria fazer e, sabe-se lá como, arranjou forças para mais um tranco. 
Caiu sentado quando, seja lá o que havia pescado, parou de resistir e foi finalmente puxado. 
Mas a felicidade de Canguinha só durou até descobrir o que havia fisgado: uma porta de Fusca. 
- Bom, pelo menos agora sei que a linha foi barata mas, é forte. 
Após mais vinte minutos desenroscando a linha da porta, voltou a jogar a isca no rio para pescar o santo almoço do santo dia seguinte. 
Desta vez não demorou muito para sentir um leve puxão no anzol. 
Puxou a vara com toda sua força, ao ponto de mais uma vez, cair de costas com as pernas para cima, dentro da lama. 
O peixe pescado era tão grande, mas tão grande, mas tão grande, que cabia com folgas na palma de sua mão. 
Curisvaldo Canguinha já apresentava uma leve irritação quando devolveu o pequeno mini micro peixinho às águas de onde tinha saído. 
Voltou a jogar as esperanças de um almoço farto no rio, e esperou. 
Esperou, esperou e esperou mais um pouco porém, nada aconteceu. 
Já estava quase desistindo quando, sentiu uma nova fisgada na linha. 
Sem a mesma convicção das duas primeiras vezes, puxou a vara.
E a vara foi puxada de volta. 
E ele tornou a puxar. E tornou a ser puxado. 
- Dessa vez é de verdade!
Fincou o pé em uma pedra enterrada no chão e puxou com mais força. 
Puxou, puxou e puxou. 
Já estava dando para ver o peixão que estava vindo preso ao anzol. 
Porém, Curisvaldo Canguinha via mesmo eram os reais que economizaria com aquela pescaria afinal, aquele “bitelão” daria para uns três almoços, no mínimo. 
Um último puxão e... a pedra onde Canguinha tinha apoiado o pé soltou e o pobre do Curisvaldo caiu de cara na água, dando assim a oportunidade do peixão se soltar e fugir. 
Ainda mais molhado e, cada vez mais irritado, Curisvaldo teimoso e canguinha que só, não desistiu. 
Trocou de lugar porque, como todos sabem, era o local escolhido que estava trazendo azar para a pescaria e, obviamente era só ir para outro lugar que choveria peixes para o Canguinha. 
E mais uma vez, vai linha, anzol e isca para dentro do rio. 
Desta vez demorou tanto que o Canguinha até voltou a cochilar mas, eis que de repente, um novo e fortíssimo puxão na linha, o acordou. 
Sem querer perder uma nova oportunidade e nem dar sopa para o azar, Curisvaldo puxou a vara de pescar com toda força que era possível. 
Estranha e curiosamente, ouviu um barulho parecido com tecido rasgando. Mas isso era coisa para se pensar depois. 
O importante era economizar e levar para casa, ao menos um peixe. 
Para sua surpresa e estranhamento, havia fisgado um short rasgado. 
Não demorou para entender o que havia acontecido: o anzol tinha acabado preso no short de um rapaz que passava nadando no local. 
Após muita confusão, Curisvaldo cedeu muito a contragosto, um short que trazia embaixo da calça para o rapaz que se encontrava só de cuecas dentro da água. 
Mas Curisvaldo Canguinha estava determinado a não comer carne na Santa Sexta-feira e não sairia dali sem ao menos tentar fisgar algum peixe, nem que fosse outro daqueles que cabia na palma da mão. 
Já eram em torno de onze e meia da manhã. 
Quando o relógio, como diziam os antigos, já badalava as três da tarde, Curisvaldo Canguinha ainda estava sentado esperando algum peixe morder a isca. 
A essa altura a fome, o sono e o cansaço já minavam a resistência do pobre Canguinha. 
Já convencido de que os peixes, ou haviam descoberto que naquela data todos os desejavam para o almoço e se esconderam ou, estavam no fundo do rio rindo as suas custas, Curisvaldo pensava em desistir. 
Mas o instinto da canguinice era forte e ele estava decidido a nem comer carne e nem gastar muito dinheiro com peixaria. 
Para finalizar está história de pescador que nunca aconteceu mas que eu, como bom contador de causos garanto que é verdadeira, digo a vocês que, Curisvaldo Canguinha, demorou um pouco mas, acabou desistindo da pescaria. Mas, obstinado que é, comeu peixe no santo dia seguinte e não gastou quase nada com isso. 
E não pense que o Canguinha foi “filar bóia” na casa dos outros. 
Curisvaldo é canguinha mas é orgulhoso. 
Saindo da pescaria frustrada, comprou temperos, leite de côco, azeite de dendê e fez uma bela, barata e cheirosa moqueca de... sardinha em lata.

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