Tudo começou quando São Pedro começou a se sentir sobrecarregado com as tarefas que tinha que cumprir lá no Céu.
Como é sabido por todos, ele ficou responsável pelas chaves dos Portões Celestiais e, como consequência, tem que selecionar quem entra no Paraíso e quem vai ter que descer para o andar de baixo.
Acontece que, a cada ano que passa, a quantidade de gente entrando nesta fila só faz aumentar, o que gera um aumento constante em sua carga, já não muito pequena de trabalho.
Além disso, não dá para esquecer que São Pedro também é responsável por decidir onde vai e onde não vai chover em todo o planeta.
E, para completar, ainda é padroeiro dos pedreiros, pescadores e porteiros.
Em determinado dia, sabe-se lá quando, ele resolveu que precisava de, pelo menos, uma dezena de anos para tirar férias.
Quando teve seu pedido negado, escreveu o seguinte memorando interno, direto para o próprio Criador:
“ Caro Criador,
Venho através deste documento externar minha indignação com a recusa para minha solicitação de um merecido e justo período de férias.
Consta que estou me sentindo sobrecarregado pelo excesso de atribuições e serviços que me são solicitados e, pela ingratidão daqueles a quem necessito atender. Se parecer injusta minha reclamação, eis que explicarei:
Atualmente estou acumulando os cargos de Guardião dos Portões do Céu, responsável pela distribuição das chuvas pelo mundo, padroeiro dos trabalhadores da construção civil, dos pescadores e dos agentes de portaria, além de ter que responder pela devoção do pessoal que prefere me chamar de Xangô, o que me traz mais uma demanda enorme de trabalho.
Em todas estas atribuições, a insatisfação dos seres humanos, aumenta meu nível de stress e a necessidade de um merecido descanso.
Veja bem, Altíssimo, o serviço de Guardião dos Portões Celestiais, além de só aumentar por causa da violência de Vossos filhos, ainda está me causando um sério problema com o Tinhoso que vive a encher meus santificado saco, por achar que, estou recusando gente demais aqui e sobrecarregando seus domínios. Alega que o custo de morte lá está altíssimo, com direito a recessão, inflação, aumento de impostos, superpopulação e que, eu poderia diminuir o nível de minhas exigências para que mais pessoas entrassem no céu, o que diminuiria estes excessos no Inferno. Agora veja se eu posso colocar esse monte de gente ruim aqui dentro dos Portões Dourados só porque o vermelho rabudo não sabe administrar seu Reino e nem bota esse povo para trabalhar?
Já o serviço de distribuir as chuvas está ainda mais complicado. Vossos filhos vivem desmatando as florestas, utilizando produtos que destroem a camada de ozônio, entre outras burradas, e vivem me culpando pelo descontrole do clima. Abro as torneiras para chover no Nordeste do Brasil e não consigo porque só tem mandacaru plantado lá, abro as torneiras para fazer chover em alguns lugares da África e está tudo desmatado... o que eu posso fazer se as águas que mando não conseguem subir de volta? Inclusive já está faltando água aqui em cima e não lavo o tanque de minha casa desde 1996!
Fora que aconteceu um vazamento aqui e começou a descer enxurrada lá para a Terra, alagando um monte de lugares. E, com quem eles reclamam? Com o pobre do São Pedro, como se eu fosse encanador.
Eles que reclamem com o São Vicente, padroeiro dos encanadores!
Por falar em profissões, ainda tenho que dar conta de ser padrinho dos pedreiros, dos pescadores e dos porteiros. Os pescadores reclamam da escassez de peixes, causado por eles mesmos que pescam fora de época (saudades de quando eles se queixavam com o Netuno), os porteiros reclamam da falta de educação dos moradores dos prédios e condomínios, como se eu fosse o padroeiro da educação, para dar jeito neste povo mal-educado (eles deveriam reclamar era com a Santa Tereza, e não comigo), e para terminar ainda tem os pobres pedreiros... Veja bem Senhor, com tanto empreiteiro corrupto, como é que eu vou garantir que eles não sejam presos e deixem os funcionários desempregados? Que culpa eu tenho? Depois o Tinhoso reclama que mando esse povo todo para o Inferno!
E ainda tem as Mães de Santo que ficam me oferecendo suborno para eu resolver os problemas lá de baixo. Nem tenho onde guardar mais tanta oferenda: minha cozinha está uma bagunça.
É São Pedro pra lá, meu São Pedrinho pra cá, meu Xangô acolá... É aqui não chove, aqui tá chovendo demais, é eu mereço entrar no Céu, eu não mereço ir para o Inferno, tome oferenda, é aqui não tem mais peixe, o morador do 42 merece morrer (como se aqui não estivesse cheio o suficiente), é a obra acabou e não tenho mais emprego... Já estou a ponto de pedir que São Judas Tadeu, o Santo das Causas Impossíveis, venha me ajudar, porque não estou mais conseguindo dar conta de tanta coisa em minhas pobres e santificadas costas, que já sofreram tanto quando eu caminhava pela Terra, fazendo serviço de Papa.
Desculpe o desabafo, Senhor Altíssimo mas, se uma providência não for tomada, serei obrigado a iniciar um período de greve por melhores condições de trabalho.
Atenciosamente, Simão Pedro”.
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