As Panelas

Óbvio que, como um cidadão consciente, sou paneleiro.

E paneleiro dos bons. Lula ia falar na TV? Batia panela.

Dilma ia falar na TV? Panela.

Temer? Panelada nela.

Bolsonaro vai falar? Panelas a postos.

As vezes bati panela sem nem saber quem estava falando. Um dia ouvi barulho de panela vindo da casa do vizinho e não contei conversa: peguei as minhas e bati também. Só depois descobri que era, na verdade, ele bêbado, tentando cozinhar e derrubando as bichinhas dentro de casa.

Mas, é claro que, como um bom paneleiro (ou panelador, nunca soube o nome direito), eu tenho duas panelas velhas já reservadas só para isso.

As bichinhas estão tão amassadas e furadas que não servem nem para carregar água. Para cozinhar, tenho meu jogo chique de panelas de uma marca famosa, é claro.

Porque? Ora pois, existem roupas de sair e roupas de ficar em casa; sapatos de sair e sapatos de ficar em casa; panelas de bater e panelas de cozinhar... até porque, nenhum político merece que eu amasse ou fure as minhas chiquérrimas KitchenAid!

E, se você não sabe o que é uma KitchenAid me perdoe, mas você é muito pouco refinado para entrar em minha cozinha e, só de ruindade não vou dizer o que é! Vá procurar no Google, ora pois!

Aquele negócio de “panela velha é que faz comida boa” é coisa de sertanejo velho e não serve para mim, pessoa moderna e sofisticada.

Mas, voltando às panelas dos panelaços, deixo-as guardadas em local seguro para que, o tonto do meu marido, não as use em hipótese alguma para preparar meu almoço ou jantar. Só eu tenho direito ao uso.

 Mas porque estou contando tudo isso?

Para que você, meu caro leitor, saiba o quanto é perigoso servir de exemplo para alguém.

Ocorre que, minhas Tramontinas começaram a aparecer amassadas e furadas. Questionei meu marido e minha empregada doméstica se andavam derrubando ou panelando com minhas panelas de cozinhar.

Ambos negaram.

Mesmo após ouvir as negativas de ambos, alertei que, as Tramontinas eu fiquei chateada mas perdoei e até não investiguei o responsável mas, se minhas KitchenAid aparecessem com um único risco... ah, a coisa iria ficar tão feia quanto a cara dos nossos últimos presidentes!

Por via das dúvidas, tranquei minhas preciosas KitchenAid em um armário e mantive as chaves comigo.

Isto porque, as Tramontinas, a cada dia apareciam mais amassadas.

Resolvi me tornar uma mistura de mulher traída com Sherlock Holmes e, certo dia, saí para o trabalho e voltei do meio do caminho para, enfim, descobrir quem era o meliante que estava destruindo minhas caras e semipreciosas Tramontinas.

Entrei na surdina, pela porta dos fundos e, bingo!

O barulho de panelas batendo era facilmente audível até do lado de fora.

Corri até a cozinha já disposta a demitir a empregada ou botar o marido para dormir dois meses, no mínimo, no sofá!

Eis que, lá chegando, vem a grande revelação:

Meus dois filhos estavam sentados em frente a tela do notebook, assistindo um vídeo de Bolsonaro discursando e, arrebentando minhas Tramontinas umas nas outras. Indignada, perguntei aos gritos:

-Mas que merda vocês estão fazendo com minhas panelas?

Foi quando o menorzinho, sorrindo, respondeu:

-Estamos brincando de bater panela quando esse homem feio fala, igual você faz, Mamãe.

Olhei para aquela situação e fiquei indecisa se ria ou chorava.