Roberto Rael era um prodígio desde que nasceu.
Reza a lenda que, quando nasceu, não chorou e sim, cantou.
De voz linda, afinação perfeita e ritmo equilibrado, Roberto já dava sinais que seria um grande cantor desde cedo.
Seu pai, o velho Malaquias, que de bobo não tinha nada, viu alí uma mina de diamantes brutos a serem lapidados e, sem perder tempo, matriculou o filho em aulas de canto e de todo e qualquer instrumento que você imaginar. E, para sua sorte e satisfação, o garoto ficava bom em tudo.
Ao completar doze anos, Roberto aprendeu a compor e criou uma música linda e melodiosa chamada “A Beleza dos Pássaros”, cantada pelo próprio.
Malaquias pegou um pen-drive com a gravação, cantada pelo próprio filho e saiu de emissora de rádio em emissora de rádio até que encontrasse alguém que ficasse encantado com tão bela obra. E, nem precisou andar muito pois, na primeira das emissoras, assinou um contrato.
A música tocou na emissora e foi sucesso instantâneo.
Logo todos na rua cantavam, não com a mesma afinação de Roberto, mas cantavam “A Beleza dos Pássaros”.
Malaquias então decidiu que, seria ele mesmo o empresário do filho pois, assim evitaria charlatões e aproveitadores, além de não precisar dar uma fatia do dinheiro a mais ninguém.
Mudou o nome de Roberto Rael para Bobby Halley, pois achou que assim ficaria mais sonoro, faria mais sentido para uma estrela e, na sua visão, tudo que era americanizado era melhor.
Ocorreu que Bobby Harley e sua canção estouravam cada dia mais nas programações das rádios e logo apareceu um convite de uma grande gravadora para um contrato.
- Estamos em uma era diferente – falou o dono da gravadora – agora lançamos tudo em plataformas virtuais de aúdio.
Malaquias não fazia ideia do que aquilo significava, mas mesmo assim, assinou um contrato para o filho.
A gravadora lançou nas plataformas a música e, o sucesso, aumentou ainda mais.
- O próximo passo são os shows – falou novamente o dono da gravadora – quais são as outras músicas dele?
Nisso, Malaquias gelou. Não tinha em momento algum pensado nisso.
Pediu um prazo e garantiu que o filho teria mais novidades em pouquíssimo tempo e, para seu alívio, realmente tinha.
Mais doze belíssimas canções, com autoria, arranjo e canto de Roberto Rael, aliás, Bobby Harley.
O pai, eufórico, levou todo material para a gravadora, já pensando nas cifras que iria arrecadar.
Na saída, empolgado, fechou logo a compra da casa na praia e do carro último tipo que já vinha namorando há um certo tempo.
Sem dinheiro vivo em mãos, parcelou em 24 vezes.
No dia seguinte, recebeu um telefonema marcando uma reunião com o dono da gravadora. Dia, local e hora marcados, lá estava Malaquias para ouvir as boas notícias.
- Senhor Malaquias, eu pedi que o senhor trouxesse mais sucessos de seu filho e, o que me trouxe foi um monte de músicas religiosas e voltada para idosos – reclamou o magnata da música.
- Deve estar havendo algum engano – reclamou Malaquias – eu trouxe as composições de meu filho! Sua equipe deve ter entregue o pen-drive errado, com certeza.
- Não tem erro nenhum. O senhor me trouxe várias canções na mesma linha de “A Beleza dos Pássaros”, e isso não faz mais sucesso.
- Como não? Fez sucesso até a semana passada!
- Semana passada passou na semana passada. Ninguém quer mais ouvir poesias e rimas bonitas. O povo quer músicas que falem de sentar, que tenham um refrão de poucas sílabas, tipo tchetcheretchetche. Seu filho tem algo assim?
Malaquias coçou a cabeça, pensou e admitiu que não sabia.
Voltou até o filho e explicou a situação. Acontece que Bobby Halley não sabia compor aquele tipo de coisa e, acabou levando três meses para compor uma dúzia de tchetcheretchetche’s, dongsdongs e coisas do tipo.
Malaquias levou o material na gravadora e, nem foi mais atendido pelo dono e sim, por um secretário que, lhe explicou que, aquele tipo de música não fazia sucesso já a um mês.
- A moda agora é falar de favela e cachaça.
Malaquias voltou e fez o pobre Bobby compor mais doze músicas sobre favela e cachaça. Até o ajudou pesquisando na internet sobre o assunto (porque tinha medo de ir pessoalmente em uma favela).
Voltou até a gravadora, onde foi atendido por um recepcionista que o alertou que a moda agora era cantar sobre corno.
Desta vez se recusou a ajudar o filho pois, não podia admitir que entendia do assunto, e saiu de casa com mais doze músicas.
Foi atendido por um advogado da gravadora que o informou sobre a rescisão do contrato, pela incapacidade de Bobby entregar as músicas no prazo e pela constatação de que, o material entregue era “lírico e sem qualidade para aquele tipo de música”.
Malaquias perdeu o processo que entrou contra a gravadora, por não ter lido no contrato a cláusula que permitia este tipo de rescisão, teve que devolver o carro e a casa na praia e, gastou os últimos reais com os honorários dos advogados.
Hoje, Bobby Halley voltou a ser Roberto Rael e vive dando aulas de piano na igreja onde ele foi forçado pelo pai a frequentar.
Malaquias é pastor da mesma igreja e, já comprou outro carro, enquanto sonha em chegar a Bispo.
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