Pense em um alvoroço, foi quando chegou a notícia que Alonso morreu.
Foi um chororô sem mais tamanho.
Apareceu até pescador contando que pescou lambari no mar de lágrimas que se formou.
Ninguém se conformava com aquela notícia.
Homem jovem, forte, saudável e morador de São Paulo, morrer daquele jeito tão estúpido.
- E ele morreu de que mesmo? – alguém perguntou.
Isso era curioso: ninguém sabia.
Só tinham recebido a notícia, vinda de Zé do Caju, que soube de Maria Cuíca, que soube de Antonio Libório, que não foi encontrado para saber de quem ele soube o que, agora, todos já sabiam.
- Olha – falou Zé do Caju, coçando a cabeça mesmo sem tirar o chapéu de palha – eu encontrei a comadre Maria Cuíca e ela só me disse estas palavras: “compadre, o Alonso morreu”.
Desandou dona Maricota, mãe de Alonso, e o Zé do Caju até a casa da comadre Maria Cuíca, atrás de maiores informações.
Fosse em uma época onde todo mundo tem celular, a caminhada seria até desnecessária, mas o suposto e ainda não comprovado óbito aconteceu lá pelos idos dos anos 70.
Chegando na casa da comadre, a dupla de duas pessoas, ficou ainda mais confusa com a informação que recebeu.
- Ver eu não vi – falou Maria Cuíca, coçando o queixo com a faca de cozinha – eu estava lavando a roupa no rio e ouvi Antonio Libório, quando passou de cavalo, comentando: “ pois é, o Alonso capotou” e, a gente sabe que capotar é morrer, né?
E lá foi o trio de três pessoas atrás do velho Antônio, para saber o que, de fato, se assucedeu.
- Olha – falou Antonio Libório, penteando a barba com um pente velho – eu não falei que ele capotou. Dona Maria Cuíca fez a futrica do jeito errado.
- Quem o senhor está chamando de futriqueira? – perguntou revoltada a comadre Maria Cuíca.
Depois de uma breve discussão regada a xingamentos e lavagem de roupa suja, a pobre Dona Maricota, finalmente, conseguiu a informação que precisava. Ou não.
- Eu disse que o padre Tenório tinha falado que o Alonso desabou! Essa velha lazarenta que fica ouvindo a conversa dos outros e ainda ouve mal! Pior que fofoqueira, só fofoqueira surda...
Sem tempo para uma nova briga, a pobre mãe correu até a igreja, com a comitiva atrás, para saber do padre o que aconteceu com seu filho.
O quarteto de quatro pessoas chegou na paróquia e, antes de se benzer, questionou, perguntou e quis saber do padre, que diabos tinha acontecido.
- Diabos, não – falou o religioso passando a mão na batina – que isso aqui é a casa de Deus. Olha o respeito.
Após as devidas desculpas ao religioso, a casa de Deus e ao próprio Criador, as explicações foram dadas pelo padre, que acabou não explicando nada.
- Eu disse ao Libório que o Alonso apagou. Esse velho tarado estava olhando para o vestido curtinho de Artêmia das Flores, e não prestou o mínimo de atenção no que eu disse.
- E quem te falou que o Alonso apagou? E apagou o que?
- Tem que ver com Saci, o coroinha. Foi ele que me disse.
Mandaram chamar então o coroinha e o quinteto de cinco pessoas aguardou ansiosamente a chegada do moleque, para finalmente saber o que aconteceu. Ou não.
- Olha - falou Saci coçando o dedão do pé – foi o Jão do Limão que me falou na feira assim:
- Você soube? O Alonso já pagou.
- Mas, em nome de Deus, como um defunto pagou? E pagou o que?
- Sei nada disso de defunto não, dona Maricota. Tem que perguntar ao Jão.
E lá desabou a comitiva até a feira, atrás do tal Jão do Limão, para descobrir de uma vez por todas, o que aconteceu com o pobre do Alonso. Ou não.
- Olha – falou Jão descascando um limão – o que eu disse a esse moleque cabeçudo foi que seu Alonso aprontou.
- Mas o que o sem-vergonha do Alonso aprontou? – questionou, já furiosa a pobre Maricota.
- Não sei. Quem me contou foi o Vadinho do açougue.
E lá foi a comitiva de sei lá mais quantas pessoas até o açougue.
Após aproveitar e comprar um quilo de chupa-molho, Jão do Limão pediu para que o outro contasse o que disse, que ele falou, que contaram...
- Olha – falou afiando a faca, Vadinho – eu disse que o Cadim das Aboboras me falou que o Alonso embarcou.
- Ai, minha Nossa Senhora do Aquerupito Santíssimo – gritou a mãe quase desmaiando – se meu filho embarcou, é porque morreu mesmo!
- Aí já não sei. Melhor perguntar pro Cadim.
E lá foi o grupo, que eu já perdi as contas de quantas pessoas, atrás do Cadim das Aboboras que, enfim confirmou. Ou não.
- Olha – falou cortando uma abobora – eu falei mesmo que ele embarcou, mas não sei se ele morreu de morte morrida. Foi o Tadeu da Rodoviária que disse ao Juca Despachante e eu ouvi quando passei.
O grupo, que mais parecia uma romaria a Nossa Senhora dos Farrapos, correu então até a rodoviária para ver se, Tadeu ou Juca finalmente esclareciam aquela loucura. Ou não.
Chegando lá, perguntaram ao Tadeu que saberia trazer luz a toda esta confusão. Ou não.
- Olha – falou enquanto palitava os dentes com um pedaço de capim – pediram para eu não falar nada desse assunto com a mãe do Alonso. Nem sei como essa história chegou nos ouvidos dela. Mas, como a senhora está aflita, vou dizer. O que eu disse foi que o Alonso desembarcou aqui na rodoviária tem uns vinte minutos e, ia para casa fazer uma surpresa para a mãe. Mas, não sabia que ele tinha morrido daqui pra lá...
Dona Maricota desmaiou e foi outro alvoroço:
Trouxeram sais para a pobre senhora cheirar. Não deu certo.
Trouxeram água morna para ela cheirar. Não deu certo.
- Dá um pouco de conhaque a ela – sugeriu alguém.
Após a quarta tentativa, um quase bêbado Jão do Limão finalmente chegou com o único conhaque que não tinha bebido no caminho.
- É que também estou nervoso – justificou enquanto bambeava sobre as próprias pernas.
Foi só aí que finalmente, a pobre e chorosa dona Maricota reanimou.
Neste momento, Alonso apareceu para terminar de vez com aquela confusão. Ou não.
- Mamãe! Estive em sua casa e a senhora não estava lá...
E tomou um safanão de dona Maricota.
- Isso é para você aprender a deixar de ser mentiroso e nunca mais dar susto na mãe! Só diga que morreu quando tiver morrido mesmo.
- Xi – pensou Alonso, esfregando a cara – minha mãe já está caducando.
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