Se ainda tem alguém que não sabe, abadás são aquelas camisas caríssimas que todo mundo compra para “sair” nos blocos de Carnaval na Bahia.
Eu entendo tanto de Carnaval quanto o Carlos Drummond de Andrade entenderia de letras de funk carioca e, por isso, me assustei quando resolvi comprar um par de abadás para agradar a Terezinha, minha namorada.
A bichinha vivia me dizendo o quanto queria passar um Carnaval em um desses blocos e eu, apesar de odiar esta festa, resolvi fazer essa “graça” para ela e saí a caça do tal abadá do Chiclete com Banana.
O problema é que estou longe de ser rico nesta ou na próxima encarnação e, quando descobri o preço daquele mísero pedaço de pano, tive um pico de hipertensão. O vendedor, muito atencioso, me explicou longamente todas as vantagens que vinham no pacote daquela camisa amaldiçoada mas, eu saí da loja deixando para ele a promessa de voltar para efetuar a compra e, comigo mesmo, o juramento de jamais pagar aquela fortuna que ele havia cobrado.
Na saída do shopping, um cidadão bem vestido para um baile de Dia das Bruxas, se aproximou de mim e falou que tinha notado que eu estava interessado no abadá do “Chicrete” e que, por coincidência, ele tinha dois para vender pois, logo após a compra, soube que sua vozinha havia falecido.
- Sabe como é – falou com os olhos cheios de lágrimas – família é tudo e, não tenho mais clima para cair na folia.
Eu recusei pois ainda estava assustado com o preço e minha pressão permanecia alta, mas ele me disse que tinha simpatizado com minha pessoa, sabia que eu queria muito aqueles abadás e por isso, faria pela metade do preço da loja.
Devo ter feito uma cara de espanto e desconfiança bem explicita porque, ele passou a me explicar que todo ano saia naquele bloco e, por isso, comprava sempre vários meses antes com desconto.
- Eu não saio perdendo porque recupero o que gastei e você sai ganhando porque compra bem mais barato. Bom para nós dois.
Minha pressão começou até a voltar ao normal com essa possibilidade.
Depois de pensar por alguns instantes e imaginar a alegria de Terezinha, aceitei e fechei o negócio.
Paguei, recebi os abadás e, como garantia, peguei o número do telefone do cidadão para o caso de surgir algum problema.
Ainda faltavam uns dois meses para o Carnaval e resolvi que não iria dar as boas novas para Terezinha naquele mesmo dia. Esperaria faltar uma semana para a folia porque assim seria mais legal de dar a notícia.
Acontece que, por uma dessas muitas voltas que a vida dá, eu e Terezinha terminamos o namoro e, além de ficar sem a namorada, fiquei com dois abadás sem nenhuma utilidade porque, com ela eu iria sem gostar e sem ela eu nem iria para essa festa dos demônios.
Fiz então o mais lógico a se fazer numa situação dessas: liguei para o cidadão que me vendeu para saber se ele conhecia alguém que tivesse interesse em comprar aquelas duas camisas, pelo mesmo preço que comprei.
Porém, a pessoa que atendeu jurou que não era, não conhecia e jamais tinha ouvido falar nem de mim, nem de quem me deu o número ou de qualquer venda de abadá, mas que até tinha interesse na compra pois, quando foi adquirir o dele e o da esposa, já tinham acabado.
Marcamos então em uma estação de metrô e, pontualmente, lá estava no horário e local combinado para efetuar a venda e me livrar daquele prejuízo.
Quase terminou em briga.
O cara ficou possesso, me acusou de ladroagem e até chamou a polícia.
Contei esta mesma história ao delegado pois, estava sendo acusado de uso de má fé ao tentar vender um abadá de dois anos atrás como se fosse o que seria usado naquele mesmo ano.
Agora estou aqui sentado na delegacia, esperando meu advogado chegar e pensando como pude ser tão burro de nem ter aberto o pacote para ler no próprio abadá, o ano da festa.
Se eu não der notícias nos próximos dias, é porque estou preso pois, a cara que o delegado está me olhando não é a de quem quer ser meu amigo.
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